domingo, 29 de agosto de 2010

O encontro

Ele foi o primeiro a chegar. Ocupando o lugar que lhe era destinado, passou a observar todos os preparativos do pessoal da casa na arrumação do evento.
As mesas sendo cobertas por toalhas vermelhas e brancas recém chegadas da lavanderia. Pratos e talheres sendo dispostos com precisão milimétricas. Como em uma dança exaustivamente ensaiada, os funcionários executavam suas tarefas seguindo uma marcação invisível.

Dispensa cortesmente um garçom que viera lhe oferecer uma bebida. Sabia que havia chegado antes do horário combinado, mas a ansiedade tomara conta das suas emoções.
Havia esperado dois anos por aquele momento. Setecentos e trinta dias recheados de inúmeras horas de incertezas, dúvidas e temores de não conseguir alcançá-lo.

Mas lá estava ele, cercado por aquelas paredes de tijolo à vista com mais de duzentos anos de história. Quantas alegrias e tristezas foram presenciadas por elas.
Amores iniciando e encontrando um fim, celebrações, amizades, sonhos de sucesso nos dois lados do balcão.

Marco, proprietário da casa, da porta de entrada acena avisando que os convidados já estavam chegando.

As primeiras a entrarem eram a sua mulher e as suas filhas. Responsáveis por tudo e por todos, ele sabia que sem a dedicação e trabalho de suas mulheres, esse evento seria impossível. Maior presente que a vida havia lhe dado, elas eram o alicerce, a base sólida que suas pernas trôpegas encontraram para se manter em pé e prosseguir na luta do dia a dia, principalmente nesses últimos tempos. Lindas, amorosas, leme forte do seu barco em mares revoltos. Nenhum agradecimento seria o bastante para compensar todo o amor recebido.

Apoiada nos braços das suas filhas vinha sua mãe. Qualquer definição da palavra mãe teria que levar o nome daquela mulher. A entrega, dedicação em tempo integral para os filhos, a anulação pessoal em benefício do crescimento da sua prole, a professora, a mestra para todos os momentos. Caminho e exemplo. Pai e mãe pela vida.

Ao lado da sua mãe, os pais da sua mulher. Era engraçado como o tempo e a convivência funde e amolda as relações e as pessoas. Os três ali, juntos, passam a representar um único sentimento: nossos pais, meus e da minha mulher. O pai, responsável direto por esse encontro. Dele era a pátria agora compartilhada por todos. Cada ponto daquela cidade, suas muralhas, seu anfiteatro, suas torres, já estavam em nossos pensamentos mesmo antes de conhecê-la. Porque fora dele o maior ensinamento que um pai pode passar ao seu filho, ele havia ensinado a amar. Das filhas a terra distante, amar sempre amar.

A prima conduzia a sua tia, que aceitara uma incumbência maior, ser a sua madrinha.
Uma mulher excepcional, que pelo porte e elegância afugentava o passar dos anos, tratando a vida com a leveza da adolescência.

Na sequência vieram seus irmãos. Os de sangue, os que vieram com os casamentos e os que ele escolhera pela vida.

O irmão mais velho, que apesar das distâncias em determinadas fases da vida, sempre fora o seu norte, o seu instigador de comportamento. A mulher, cuja força fora testada na mais cruel das provações, estava ao seu lado, fiel garantidora do equilíbrio do casal. Estavam representando o irmão mais novo, que por compromissos profissionais inadiáveis não havia podido comparecer. O caçulinha, seu companheiro dos carrinhos e das brincadeiras de cowboy.

O seu irmão dos bancos de escola. Juntos deram os primeiros passos pelos caminhos da juventude. Bailinhos, esportes, namoradas, até a descoberta dos segredos do amor e do sexo. Encontrara uma companheira para a vida com um coração enorme, que fazia da sua profissão uma ferramenta de ajuda aos necessitados.

O irmão da faculdade, que na verdade lhe chegara pelas mãos da sua irmã. Sócios na vida e pela vida, um ombro sempre presente em seus momentos de aflição e insegurança.

Os irmãos advindos do casamento. Um casal que se completava em seus sonhos e objetivos, que sabiam dividir com todos que os cercavam a alegria de viver a vida.

Os irmãos de porta que haviam sabido transformar o corredor que os separava em uma extensão da própria casa. A recepção e o carinho no acolhimento do casal que chegava. Amigos, filhos e afilhados, a união de uma família.

E, é claro, os irmãos da casa comum. Ele recebera de Deus o dom de salvar vidas enquanto a mulher fazia a sua parte cuidando dos aflitos. Par perfeito para um trabalho abençoado.

Fechando a entrada dos convidados, a sua família da terra. Tios, tias e irmãos conquistados pelo amor e simpatia.

Agora todos estavam lá, em uma demonstração que a verdadeira família não necessita de uma pátria comum, nem ao menos de um sangue comum. Ela precisa sim é de amor, de compreensão, de um claro entendimento das diferenças. Sim, porque as diferenças não existem para separar, mas para complementar o ser humano e fazê-lo entender o caminho que ainda falta percorrer em busca do seu crescimento.

Os lugares estavam preenchidos. Ele olha a sua volta encontrando em cada rosto um sorriso acolhedor. Pergunta-se se de alguma maneira merecia todo esse afeto e dedicação, essa cumplicidade de sentimentos e emoções. Sabe que cada um deles representa um pedaço do seu conhecimento e que unidos formavam o mosaico da sua vida.

O dia havia chegado. O objetivo havia sido alcançado. Agora todos formavam a mesma família. Uma família unida apenas pelo fio condutor do amor, do querer bem.

Fecha por instantes os olhos e pede a Deus que lhe dê, por um minuto que seja, a sabedoria para poder transformar todas as suas emoções em palavras, para que pudesse expressar a imensa felicidade que estava vivendo.

A garganta parece diminuir e teimosamente algumas lágrimas tentam atingir seus olhos.
Agora não, agora ele não podia chorar.

Respira fundo e pondo-se de pé ergue um brinde. A hora chegara.

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