quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

Agradecimento a uma inimiga

Patrícia Diguê


Já se vão uns cinco anos de convivência. Vinha resistindo escrever sobre você. Puro medo. Preferia te ignorar na ilusão de que assim você desaparecesse da minha vida. No começo achava que me livraria rápido de você. Era apenas mais uma pedra fácil de chutar. Mas você foi ficando, me irritando, me desesperando, insistindo em me acompanhar por onde quer que eu fuja. Tentei te enganar, tentei fugir, tentei te cansar e entender o porquê de tanta perseguição. A convivência não tem sido fácil. Posso dizer que é a mais complicada que já tive. Eu te odeio com todas as minhas forças, mas você não me deixa em paz. Sempre acho que já fiz de tudo para que você me deixe, mas aí você insiste em aparecer e me obriga a encontrar uma nova alternativa para que possamos continuar convivendo com um mínimo de sanidade. Às vezes me conformo com sua presença, às vezes choro de raiva. Mas , fazendo um balanço desses anos todos, tenho que reconhecer que preciso te agradecer e talvez reconheça ainda mais seu valor daqui a um tempo. Com certeza tomarei consciência da sua importância quando você não estiver mais por perto. Não acho que sentirei saudades, já seria demais, mas te entenderei melhor quando nossa relação doentia acabar e eu puder olhar tudo com distanciamento. É verdade que talvez você nunca me deixe, eu sei, preciso considerar esta possibilidade. Mas ainda assim tenho que te agradecer por me ensinar tanta coisa sobre mim mesma.

Obrigada por me mostrar que não sou a senhora da minha vida; que não sou um robô com botões de controle; que igual a todo mundo sou fraca; que não posso querer ser tudo; que não posso ignorar meus sofrimentos, porque eles se manifestarão de formas muito mais destruidoras no futuro. Obrigada por me ensinar a compreender quem sofre; que algumas pessoas são mais frágeis que as outras e que às vezes só precisam ser ouvidas; por mostrar ainda que a maioria das pessoas quer se esconder em uma máscara de infinita felicidade, mas que no fundo enfrentam terríveis fantasmas também. Obrigada ainda por me mostrar que a vida não e uma ciência exata, que remédio não cura doença da alma e que buscar a paz leva tempo. Agradeço ainda a me obrigar a ter paciência; a ver que transformações levam o tempo que elas necessitam e não o que a nossa razão impõe; e também que cada um tem um tempo diferente. Enfim, a lista de contribuições seria infinita. Você me fez reavaliar tudo que sou desde que nasci, tudo que fiz de bom e mau, o que vinha fazendo comigo até aqui, me obrigando a repensar rotas, a jogar máscaras fora, a não ter vergonha de chorar e a buscar uma verdade. Estou longe de chegar nela, mas certamente seria um ser humano menos sensível e vazio se você não tivesse aparecido em meu caminho, derrubando todas as minhas certezas e minhas defesas, me obrigando a me render às forcas que regem o mundo em vez de tentar mudá-lo. Obrigada, insônia, por me mostrar que não sou nada, apenas mais um ser humano atrás de caminhos para aliviar a dor de existir.

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