quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Quando a paixão tem data de validade

Patrícia Diguê


O cenário era uma praia paradisíaca no nordeste do Brasil. Enquanto a maioria dos seis ou oito passageiros da van se olhavam com timidez, ele desembestou a perguntar de tudo pra todo mundo e em instantes já davam risada como velhos amigos. Graças a isso, o percurso de mais de uma hora entre o aeroporto e o hotel ficou curto, passou despercebido. Na chegada, recepcionistas com coco gelado, sorrisos de boas-vindas e aquele sol brilhando... só faltaram dançarinas fazendo o ula-ula. Dava para esquecer fácil que se tratava de um congresso profissional e se imaginar em um daqueles filmes que o magnata americano decide passar um fim de semana logo ali, em uma praia exótica da América do Sul.

Nesse clima de ilha da fantasia, percebeu que aquele moço brilhava mais que as jacuzzis que pareciam sair da areia ou o mar que se juntava em um tom só com o céu. O sorriso aberto se abria para todos, mas o olhar de tom verde já havia escolhido uma direção. Trocaram algumas palavras, riram e se viraram as costas, em direção aos quartos de lados opostos. Na primeira tarde de palestras, resolveu nem aparecer. Foi esfriar a cabeça no mar. A aliança na mão direita lhe lembrando toda hora do que era certo. As fantasias lhe atormentando a cabeça naquele cenário perfeito, queimando os miolos mais que o sol de 40 graus.

À noite, jantaram juntos, falaram sobre sites de relacionamento, eleições, desemprego, e tentaram ainda descobrir o que faziam ali naquele resort de bacanas, sendo patrocinados por uma indústria situada a horas de voo de onde trabalhavam. Acabaram decidindo que tudo se tratava de uma conspiração patrocinada por uma grande corporação internacional. Saíram sem rumo pela pequena vila, beberam e riram mais. Mas ao terminar da noite, viraram as costas, em direções opostas. Ambos deitados em suas camas kingsize, de lençóis brancos e macios, tentaram se convencer do que era moral e certo. E assim adormeceram, fortes em suas convicções.

Ao fim do dia seguinte, trocas de telefones e emails de praxe e se disseram adeus. Nunca mais ouviram um do outro.

Agora o cenário era um jantar importante no interior de São Paulo. Sabiam já que se encontrariam. Um ano havia se passado. Mas o que para ela parecia uma segunda chance do destino, se transformou em água gelada goela abaixo. Desta vez, a aliança havia pulado para o outra mão. Engoliu, olhou discretamente para suas mãos e lhe cumprimentou polidamente. Mas a sensação semeada naquele congresso chato de industriais entediantes aflorou com efeito reboque e naquela noite não enxergavam muita coisa além de um ao outro. Para piorar, ainda naquela noite saberiam que viajariam juntos para o outro lado do mundo em breve.

Nos primeiros dias, longe de qualquer olhar de reprovação, deram vazão a todo ímpeto controlado. Confessaram sentimentos naquele ano que passou. Ela, um arrependimento por ter deixado uma possível grande paixão passar. Ele, a angústia por ter vestido a fantasia do personagem de um roteiro pré-programado.

Mas o conto tinha data de validade. Duas semanas. Já nas últimas noites, ela foi direto para o seu próprio quarto. No mundo real, não cabia aquele amor. E, na volta, no aeroporto, mais uma vez se deram as costas, e foram para suas cidades em direções opostas. Ele vive o sonho de um dia poder deixar o palco e aposentar sua máscara. Ela segue incessante pelo mundo na busca de uma nova grande historia de amor.

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